Rebelião de Páscoa na Irlanda – 1916

“O direito do povo da Irlanda de possuir a Irlanda”

Frase que compõe a declaração de Independência da Irlanda

 

O início do século XX, foi um período de muitas instabilidades políticas, econômicas e sociais que culminaram na Primeira Guerra Mundial. Esta guerra foi marcada por grandes confrontos que envolveram diversos países do mundo, porém não podemos nos esquecer dos chamados “conflitos periféricos” que ocorrem concomitantemente aos principais embates dessa guerra. A Rebelião de Páscoa (Easter Rising), que ocorreu em abril de 1916, na Irlanda, foi um desses conflitos no qual os irlandeses lutaram pela independência do país.

Para compreender melhor as razões que culminaram na Rebelião de Páscoa é preciso ter em mente como o imperialismo britânico funcionava naquela região. Ainda no início do século XIX, entrou em vigor o chamado Ato de Unificação (Act of Union) que deu origem ao Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda. Na prática, essa entidade, controlada pelos ingleses, começou a governar a Irlanda abolindo o Parlamento Irlandês que passou a ter apenas representantes no Parlamento Inglês, sendo assim, sua criação não trouxe benefícios políticos e sociais para os irlandeses.

Ao longo deste século, apesar da estabilidade econômica que a Grã-Bretanha vivenciava com as Revoluções Industriais, a Irlanda enfrentou grandes crises alimentares como, por exemplo, A Grande Fome (1845-1849), que foi uma das maiores catástrofes demográficas da Europa, matou grande parte da população e levou ao êxodo de milhares de irlandeses para países como os Estados Unidos. A questão religiosa era outro ponto que gerava muita insatisfação em relação ao domínio britânico, a Irlanda, historicamente influenciada pela religião católica, fora submetida ao reino que tinha o Anglicanismo como religião oficial.

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Memorial na região central de Dublin em homenagem aos irlandeses que morreram ou tiveram que mudar suas vidas por causa da Grande Fome. 

A insatisfação irlandesa em relação ao imperialismo britânico não parava de crescer, assim como os movimentos nacionalistas que visavam libertar a Irlanda do domínio britânico e recuperar a cultura irlandesa, ganhavam cada vez mais popularidade entre os irlandeses. A Irmandade Republicana Irlandesa (The Irish Republican Brotherhood), liderada por James Connolly, os Voluntários Irlandeses (Irish Volunteers), liderados por Patrick Pearse, o Exército Civil Irlandês (Irish Citizen Army) e o Conselho de Mulheres Irlandesas (Irishwomen Council) foram os principais grupos que participaram da rebelião que almejava a proclamação da independência e a criação da República da Irlanda.

O movimento por independência encontrou na Grande Guerra uma oportunidade de liberdade, partindo do princípio de que a Grã-Bretanha estaria muito ocupada no conflito mundial e possivelmente não deslocaria muitas forças para combater a insurreição irlandesa. Por outro lado, os alemães acreditavam que uma rebelião na Irlanda poderia desmobilizar forças britânicas o que ajudaria a Alemanha a vencer o conflito. Pensando assim, os alemães enviaram um navio cheio de armamentos para os rebeldes, porém a Marinha Real Britânica conseguiu interceptar esse navio.

Mesmo sem a ajuda alemã, na manhã do dia 24 de abril de 1916 teve início a Rebelião de Páscoa que terminaria seis dias depois, no dia 30 de abril daquele ano. A insurreição foi planejada e organizada pela Irmandade Republicana Irlandesa e contou com a vital ajuda dos Voluntários Irlandeses, do Exército Civil Irlandês e do Conselho de Mulheres Irlandesas (grupo paramilitar formado apenas por mulheres). Naquela manhã, aproximadamente 1200 rebeldes dividiram-se em grupos com o objetivo de tomar os principais pontos da cidade de Dublin.

O GPO (General Post Office), o equivalente à central dos Correios, foi ocupada pelos rebeldes e imediatamente tornou-se a sede do quartel-general da rebelião. Do lado de fora duas bandeiras republicanas foram hasteadas e o líder Patrick Pearse leu a Proclamação da República da Irlanda.

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Proclamação da República da Irlanda

Assim como o GPO outros importantes prédios e pontos da cidade foram tomados como, por exemplo, o Dublin City Hall (Prefeitura), Four Courts (Palácio da Justiça), Jacob´s (importante fábrica de biscoitos) e o parque St.Stephen´s Green. Vale lembrar que a rebelião concentrou-se na capital Dublin, porém pequenos levantes ocorreram nos condados de Mearth, Galway e Wexford.

Com um começo promissor o levante alcançou grandes vitórias, principalmente nas primeiras horas, quando os rebeldes conseguiram tomar importantes pontos da cidade. Porém, a Grã-Bretanha não estava disposta a permitir que a rebelião crescesse, sendo assim, mobilizou forças militares para acabar com a insurreição. Chegaram à Irlanda tropas britânicas com aproximadamente 16 mil soldados e mais mil policiais para sufocar a rebelião que contava com aproximadamente 1250 rebeldes. Além da discrepância numérica havia também a enorme diferença entre os armamentos usados pelos dois lados do conflito, enquanto os soldados britânicos usavam metralhadoras, os rebeldes tinham à disposição apenas carabinas.

Os britânicos conseguiram sufocar a rebelião, os rebeldes resistiram até o dia 30 de abril quando se renderam. A revolta durou seis dias e teve como resultado a morte de aproximadamente 500 pessoas, mais da metade desse número fora formado por civis. Os 16 líderes da rebelião foram julgados e executados. Esta ação do governo britânico gerou indignação e revolta entre os irlandeses e uma nova onda anti-imperialismo começa a ganhar força na Irlanda. A rebelião pode não ter tido o sucesso que os rebeldes esperavam, porém tornou-se um momento simbólico e cheio de significados na luta pela independência irlandesa que aconteceria seis anos depois, em 1922.

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Interior de Kilmainham, a cadeia onde os líderes da rebelião foram presos e executados. Hoje o espaço se converteu em um museu na cidade de Dublin.

O ano de 2016 é o centenário dessa rebelião que instigou nos irlandeses o espírito de liberdade e luta por uma Irlanda para os irlandeses. É possível encontrar exposições, passeios, homenagens em todos os pontos da capital irlandesa, além de a cidade contar com ruas nomeadas com os nomes dos principais líderes dessa revolta, o que prova que este foi um evento importantíssimo para a História daquele país. Ainda sobre o centenário, foi criada uma mini-série televisiva chamada Rebellion que narra a Rebelião de Páscoa irlandesa a partir do ponto de vista de três mulheres que possuem diferentes histórias de vida, motivações e participações dentro da rebelião. É uma obra riquíssima que ajuda a compreender esse momento importante da história irlandesa abordando os eventos a partir do olhar de um grupo de rebeldes que muitas vezes são negligenciados, as mulheres.

Assista ao trailer da mini-série:

 

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Uma resposta para Rebelião de Páscoa na Irlanda – 1916

  1. Luciana Sabino De Freitas Cussi disse:

    a série é ótima, referências históricas coerentes

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